A conferência de abertura do VIII Senacem (Seminário Nacional de Currículo e Ensino Médio) trouxe ao palco o professor Idevaldo da Silva Bodião (UFC), que, em um discurso contundente, avaliou as três últimas décadas de reformas no ensino médio brasileiro e apontou perspectivas para o futuro. Sob a mediação do professor, Emerson Augusto, da Universidade Federal Rural do Semi-Árido (Ufersa), o evento ocorreu ontem à noite, 27, Auditório Amâncio Ramalho, na Ufersa, em Mossoró.
Com o tema “Ensino Médio em Reformas: três décadas de crise e resistências – avaliação e perspectivas”, o palestrante destacou a complexidade e os desafios históricos enfrentados pelo ensino médio no Brasil, caracterizado por um modelo desigual desde sua concepção. Para o professor Bodião, o fracasso do sistema educacional não é casual, mas um projeto que perpetua a exclusão social.
“O que temos no Brasil é uma escola para a classe dominante e uma escola pobre para os pobres. Como dizia Darcy Ribeiro, o fracasso da escola brasileira não é um fracasso, é um projeto. Ela está cumprindo o que foi designada a fazer: não promover a inclusão ou o avanço social, mas perpetuar desigualdades”, afirmou Bodião.
Ao longo de sua exposição, o conferencista sublinhou que, embora reformas tenham sido implementadas desde os anos 1990, incluindo a recente revisão da reforma do ensino médio aprovada no governo Lula, os avanços ainda são insuficientes. Ele ressaltou que o atual modelo educacional se mantém preso a uma lógica tradicional, centrada em conteúdos e avaliações, enquanto a modernização tecnológica, vista como um diferencial, não significa necessariamente inovação pedagógica.
O conferencista destacou a disparidade entre escolas públicas e privadas, especialmente em relação ao acesso à tecnologia. Segundo ele, enquanto algumas instituições particulares investem em equipamentos de ponta, muitas escolas públicas ainda lutam por condições mínimas de funcionamento. Porém, o professor alertou para o equívoco de associar tecnologia à qualidade educacional.
“Há uma diferença substantiva entre ser tecnologicamente moderno e pedagogicamente moderno. O foco excessivo em ferramentas tecnológicas não resolve o problema estrutural de uma educação que continua sendo tradicional e excludente, mesmo com todos os aparatos tecnológicos disponíveis”, analisou.
PERSPECTIVAS – Ao abordar os desafios enfrentados por professores em formação, Bodião destacou a importância da resistência como postura política e ética. O professor incentivou os jovens educadores a se engajarem na construção de uma educação inclusiva, que vá além da preparação para vestibulares e promova a formação humana integral. “Nosso papel é resistir. Nem desistir, nem fugir. Resistir. A educação é fundamental para tornar o Brasil mais justo, igualitário e fraterno. Isso exige de nós não apenas ensinar conteúdos, mas também lutar pela efetivação de leis que garantam a qualidade e a equidade na educação”, afirmou.
O VII Senacem e o III Interdisciplinar, que seguem até sexta-feira (29/12), reúnem professores, estudantes e pesquisadores em torno de debates cruciais para a educação brasileira. O Senacem aborda o tema “Ensino Médio em Reformas: Três Décadas de Crise e Teimosia – Avaliação e Perspectiva”, enquanto o Interdisciplinar discute “Diálogos além das fronteiras: ciências, culturas e contemporaneidades”. Ambos os eventos buscam fomentar reflexões interdisciplinares e propor caminhos para uma sociedade mais justa e inclusiva.
Com discursos provocativos e propostas desafiadoras, o evento reafirma o compromisso de educadores e pesquisadores em enfrentar as contradições do ensino médio brasileiro e lutar por transformações estruturais no sistema educacional.