As práticas agroecológicas centralizam as discussões na programação do I Congresso de Agroecologia do Semiárido que prossegue na Universidade Federal Rural do Semi-Árido até essa sexta-feira, 16. A troca de saberes entre universitários e pequenos agricultores familiares tem sido um diferencial da programação. Além de estudantes de várias universidades da Região Nordeste, o Congresso conta com a participação de 70 agricultores da zona rural de Mossoró.
As atividades de campo, composta por quatro oficinas práticas, empolga os trabalhadores rurais que se orgulham por estarem na Universidade não apenas aprendendo, mas também repassando os seus conhecimentos da lida diária. “Acho muito importante para trocar experiências com outros agricultores”, opinou Marcos Alberto Batista Fernandes, da Comunidade de Riacho Grande. A ideia dos organizadores é despertar uma maior conscientização para a prática agroecológica.
Uma consciência já presente na prática do agricultor familiar, Francisco da Luz França, do Sítio Serra Mossoró, que cultiva hortaliças orgânicas. “Cultivo alface, coentro, cebolinha e tomate sem nenhum agrotóxico”, garante. O Agricultor tem grande parte da produção dele comercializada na Feira Agroecológica de Mossoró, que acontece todos os sábado, ao lado do museu.
Criada em 2007, a Feira Agroecológica de Mossoró é exemplo da viabilidade da produção de alimentos sem o uso de produtos químicos. Inicialmente com apenas 09 agricultores, atualmente são 69 distribuídos em 15 barracas que comercializam produtos orgânicos. “Antes, comercializam algo em torno de R$ 200,00, por feira, hoje a média é de R$ 2.500,00”, afirmar Irailson Moises, o Liliu, presidente da Associação dos Produtores da Feira Agroecológica de Mossoró – Aprofam. Liliu confirma a grande procura pelos produtos, embora produção orgânica na região ainda seja pequena. “A meta da associação é capacitar novos agricultores”, adiantou. Nos últimos anos a Aprofam já realizou nove cursos de capacitações sobre o cultivo orgânico.
Grupo Verde: três décadas em defesa da agroecologia
Criado há 30 anos por professores e estudantes de Agronomia da Esam, hoje Ufersa, o Grupo Verde de Agricultura Alternativa, o G.V.A.A, uma ONG de resistência a agricultura convencional, tem como principal bandeira a produção orgânica. O Grupo Verde é responsável por três oficinas que estão sendo oferecidas dentro do Congresso de Agroecologia. “O G.V.A.A surgiu contra a hegemonia da agricultura convencional, sendo um dos mais antigos do país”, afirma o presidente do Grupo Verde, Lucas Sombra, concluinte do curso de Agronomia.
Lucas Sombra ressalta a importância do Grupo Verde na formação dos estudantes da área das ciências agrárias. “Na nossa grade curricular não existe nenhuma disciplina específicas sobre a produção orgânica”, exemplificou. O estudante ressaltou ainda a questão social com a valorização do conhecimento trazido pelos agricultores, citando, as oficinas que proporcionam a proposta de troca de saberes. “Com essa metodologia, não só repassamos como também aprendemos muito com os agricultores”, reconhece o futuro agrônomo. O trabalho desenvolvido pelo G.V.A.A também possibilita a aproximação dos universitários com o meio rural tendo como principal víeis a produção agroecológica.
Estudantes de outras instituições de ensino também demostram suas experiência para pequenos agricultores. Um grupo da Universidade Federal de Alagoas (UFAL) e da Universidade Federal da Bahia (UFPB) elogia a programação científica do Congresso de Agroecologia promovido pela Ufersa, UERN e IF-RN. Os estudantes construíram um espiral de ervas que pode ser montado numa pequena área para o cultivo de manjericão, salsa, pimenta, coentro, cebolinha, enfim, ervas de uso culinário. “O espiral de ervas é uma prática da agricultura biodinâmica dentro da agroecologia”, explicou um dos estudantes.
Guardião de sementes
Com o dom voltado para a preservação das espécies vegetais, o agricultor Antônio Rodrigues do Rosário, conhecido como Golinha, mora no Assentamento Tabuleiro Grande, no município de Apodi, mas o ofício dele já ultrapassou os limites do Rio Grande do Norte, tanto que recebeu o título de “Guardião de Sementes”, por preservar as sementes nativas da região, tanto frutíferas, quanto da vegetação que compõe o bioma caatinga. “Sempre fui contra ao desmatamento e ao uso de agrotóxicos e para mim é um orgulho como agricultor preservar a natureza”, revelou.
São sementes de milho, feijão, sorgo, melancia, jerimum, mas também de aroeira, juazeiro, jurema de embira (branca e preta), jurubeba, catingueira, entre tantas outras. Ao todo, são mais de 50 variedades, todas crioulas, ou seja, sementes tradicionais que não passaram por nenhuma aplicação de inseticidas, nem sofreram nenhuma alteração genética. O agricultor tanto troca como comercializa as sementes.
O ofício do guardião das sementes começou logo cedo, aos 12 anos, quando ele despertou o interesse pela agricultura por influência paterna. “Desde menino, mas em 2006, comecei trabalhar com o manejo da caatinga com o objetivo voltado para a multiplicação de sementes nativas”, afirmou seu Golinha. O trabalho do agricultor tem reconhecimento e o apoio de várias entidades, como: Coopvida, Sindicatos de Agricultores, Pastoral da Terra, Projeto Dom Hélder Câmara, Rede Xique-Xique e a própria Ufersa.